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quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Kropotkin Ordem vs Desordem

     A ordem, hoje, — o que eles entendem por ordem —, são os nove décimos da humanidade, que trabalham para proporcionar luxo, gozos, satisfação das paixões mais execráveis, a um punhado de ociosos.
     A ordem é a privação destes nove décimos de tudo o que é a condição necessária a uma vida higiênica, a um desenvolvimento racional das qualidades intelectuais. Reduzir nove decimo da humanidade ao estado de besta de carga, vivendo o dia-a-dia, sem nunca ousar a pensar nos prazeres proporcionados ao homem pelo estudo das ciências, pela criação artística — eis a ordem!
     A ordem é a miséria, a fome, tornadas estado normal da sociedade. É o campônio irlandês morrendo de fome; é o camponês de um terço da Rússia morrendo de difteria, tifo, fome, em conseqüência da escassez de alimentos, no meio das montanhas de trigo que partem para o estrangeiro. É o povo da Itália, levado a abandonar seu campo luxuriante para vagar pela Europa, procurando um túnel qualquer a ser perfurado, onde correrá o risco de ser esmagado depois de ter subsistido alguns meses mais. É a terra retirada do camponês pela criação de gado, que servirá para alimentar os ricos; é a terra deixada inculta, ao invés de ser restituída àquele deixada inculta, ao invés de ser restituída àquele que não pede outra coisa senão para cultivar-la.
     A ordem é a mulher que se vende para alimentar seus filhos; é a criança reduzida a estar fechada em uma fabrica ou morrer de inanição; é o operário reduzido ao estado de máquina. É o fantasma do operário insurreto às portas dos governantes.
     A ordem é uma minoria infama, educada nas cátedras governamentais, que se impõe por esta razão à maioria, e que prepara seus filhos para ocupar mais tarde as mesmas funções, a fim de manter os mesmo privilégios, pela astúcia, pela corrupção, pela força, pelo massacre.
     A ordem é a guerra contínua de homem a homem, de profissão a profissão, de classe, de nação a nação. É o canhão que não cessa de ribombar na Europa, é a devastação dos campos, o sacrifício de gerações inteiras no campo de batalhas, a destruição, em um ano, das riquezas acumuladas por séculos de árduo trabalho.
     A ordem é a servidão, o acorrentamento, do pensamento, o aviltamento da raça humana, mantida pelo ferro e pelo açoite. É a morte repentina pelo grisu, a morte lenta pelo soterramento de centenas de mineiros esmigalhados ou enterrados todos os anos pela cupidez dos patrões, e metralhados, perseguidos à baionetas, assim que ousem reclamar.
     A ordem, enfim, é o banho de sangue da Comuna de Paris. É a morte de trinta mil homens, mulheres e crianças, despedaçados pelos abuses, metralhados, enterrados na cal viva sob as ruas de Paris. É o destino da juventude russa, emparedada nas prisões, enterrada na nave da Sibéria, da qual os melhores, os mais puros, os mais  devotados representantes, morrem pela corda do carrasco.
     Eis a ordem!

     E a desordem — o que eles chamam de desordem?
     É a insurreição do povo contra esta ordem ignóbil, quebrando seus grilhões, destruindo os obstáculos e caminhando para um futuro melhor. É o que a humanidade tem de mais glorioso em sua historia.
      É a revolta do pensamento às vésperas das revoluções; é a derrubada das hipóteses sancionadas pela imobilidade dos seculos precedentes; é a eclosão de todo o fluxo de novas idéias, de invenções audaciosas; é a solução fos problemas da ciência.
     A desordem é a abolição da escravidão antiga, é a insurreição das comunas, a abolição da servidão feudal, as tentativas de abolição da servidão econômica.
     A desordem é a insurreição dos camponeses insurgidos contra os sacerdotes e senhores, incendiando os castelos para dar lugar as choupanas, saindo de seus esconderijos para ocupar seus lugar ao sol. É a França abolindo a realeza e dando um golpe mortal na servidão em toda a Europa Ocidental.
     A desordem é 1848 fazendo os reis tremer em e proclamando o direito ao trabalho. É o povo de Paris, que combate por uma idéia que, ainda que sucumbindo sucumbindo sob os massacres, lega à humanidade a ideia da comuna livre, abre-lhe o caminho rumo a esta evolução da qual sentimos a aproximação, e cujo o nome será revolução social.
     A desordem — o que eles denominam desordem são é pocas as quais gerações inteiras mantem uma luta incessante e sacrificam-se para preparar uma existência melhor para a humanidade, livrando-a das servidões do passado. São as épocas durante as quais o gênio popular toma seu livre impulso e dá, em alguns anos, passos gigantescos, sem os quais o homem teria permanecido no estado de escravidão antiga, de ser rastejantes, aviltado na miséria.
     A desordem é a eclosão das mais belas paixões e das maiores dedicações, é a epopéia do supremo amor pela humanidade!

Livro: ELEITOR, ESCUTA / A PODRIDÃO PARLAMENTAR
Autor: Sebastien Faure
Editora: Instituto de Estudos Libertários
Paginas: 38 à 42

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